Os medos e fobias na infância podem ser comuns, mas lidar com isso nem sempre é fácil. Descubra como identificar quando o medo se torna fobia e como ajudar as crianças.
Depois que nos tornamos mães e pais, passamos a ter muitos medos. Medos grandes, como da morte, que nossos filhos fiquem doentes ou se machuquem gravemente, que desapareçam e do que pode acontecer quando nossa vista não os alcança.
Temos, também, outros medos menores, mas que não são menos importantes, como receio de que nenhuma criança queira brincar com nossos filhos no parquinho, que zombem dos seus óculos ou do aparelho nos dentes, da sua altura, do cabelo ou do jeito de falar.
Lidar com nossos medos nem sempre é fácil, mas sabemos que é necessário. Com nossos filhos, não é diferente. Eles precisam aprender a enfrentar aquilo que os aflige, mas não precisam fazer isso sozinhos.
Medos e fobias na infância: existe diferença?
Eva Tartarotti, psicóloga com formações em neuropsicologia, orientação parental e comunicação não violenta, explica que o medo é uma emoção que todos nós sentimos, que é natural, racional e nos coloca em estado de alerta para que possamos nos proteger de algo que entendemos como uma ameaça.
Uma pessoa que tem medo de cachorro, por exemplo, pode ficar nervosa ao ver um animal grande e zangado, latindo muito, pois pensa que ele pode morder. “Mas essa pessoa consegue pensar, também, que pode atravessar a rua, pegar outro caminho e se manter longe do cachorro”, explica.
Quando o medo se transforma em fobia, isso muda. A resposta a essa possível ameaça se torna muito mais intensa, irracional, e coloca a pessoa em um estado que é conhecido como luta ou fuga: ou seja, ou a pessoa vai ficar paralisada, ou vai correr. Isso pode prejudicar e comprometer até mesmo as atividades do dia a dia, por mais corriqueiras e banais que sejam.
“A questão é que muitas vezes essa ameaça não é real, e, mesmo que seja, não é tão grande quanto a pessoa acha que é. Isso começa a trazer uma série de prejuízos para a vida e o dia a dia, tanto da própria pessoa, quanto de suas famílias”, explica Eva. Como, então, saber quando intervir?
Quando o medo se torna fobia
Um medo não trabalhado pode se tornar uma fobia quando passa a gerar muita ansiedade e apreensão na criança, ainda que não faça o menor sentido. Uma criança que tem medo de barata, por exemplo, pode ficar angustiada quando está brincando na pracinha e vê o inseto por perto. Essa é uma reação natural e esperada.
Mas se a mesma criança estiver em um estado constante de agonia e desconforto, que a impede de se sentar no chão da própria casa para brincar com receio de que o inseto apareça, por exemplo, pode ser um sinal de fobia, e é preciso intervir para conseguir ajudá-la. Outras manifestações físicas das fobias que são bastante comuns entre as crianças são náuseas, diarreia, dores de cabeça e suor frio.
Em seu atendimento clínico, que é especialmente voltado para as crianças e suas famílias, Eva destaca que não é só a criança que sente medo, mas os pais também. Então, o olhar do profissional precisa ser voltado para o todo, principalmente porque o contato da criança com o profissional acontece uma ou duas vezes na semana, mas é preciso que tenha continuidade nos demais dias, quando o pequeno estiver apenas com os pais.
“A primeira coisa que precisamos fazer é validar o que a criança está sentindo e acolher esse sentimento. Conversar para entender de onde está vindo o medo, não minimizar a emoção, e deixar a criança se expressar”, afirma a psicóloga. “Podemos oferecer apoio e companhia, na medida em que a criança aceitar, e também trazer histórias, brincadeiras, filmes, livros e músicas que falem sobre assunto, pois tudo isso pode ajudar”, completa.
É muito importante não invalidar nem diminuir o sentimento da criança. Por mais que para nós pareça exagero, a criança está sentindo aquilo, então pode ser muito confuso ouvir que “não precisa ter medo” ou que é “frescura”.
Uma maneira de ajudar a dar a devida proporção é conduzir a criança de modo que ela se pergunte se aquele é um medo real ou um medo da imaginação. Isso pode ajudar a dar um contorno para o medo, tornando mais fácil lidar com ele.
Quais os medos e fobias mais comuns na infância?
Durante boa parte da primeira infância, a criança não tem ainda maturidade para distinguir o que é real do que é fantasia. Com isso, muitos dos medos mais comuns podem surgir justamente porque os pequenos não sabem o que está sendo imaginado e aquilo que, de fato, está diante delas.
Medo do escuro, de dormir sozinho e de ficar longe dos pais são alguns dos mais comuns em crianças até 6 ou 7 anos. Outros bastante frequentes são os medos de insetos e outros animais, de criaturas imaginárias, como os monstros, de médico e dentista, e de situações sociais novas, como aniversário de alguém, fazer novos amigos, iniciar uma atividade como natação, balé e judô, ou o primeiro dia de aula na escola.
Eva explica que, em todos esses casos, o que pode ajudar muito as crianças e, consequentemente, os pais, é a previsibilidade. “Ter uma rotina, falar sobre cada etapa do que vai acontecer, explicar os diferentes cenários possíveis e como lidar com eles traz segurança para a criança”, afirma a psicóloga.
Então, uma boa conversa pode ajudar (e muito!) nossos filhos quando a questão é lidar com seus medos. O desconhecido tem esse poder, de nos colocar em uma posição de vulnerabilidade. Que tal, então, lidar com isso destrinchando aquilo que parece muito grande em pedacinhos menores?
O quarto escuro continua tendo os mesmos móveis e brinquedos que tinha quando a luz estava acesa. Os pais estão dormindo no quarto ao lado, e uma lanterna pode ajudar a chegar até lá no meio da noite se assim for preciso. O passo a passo do encontro com médicos e dentistas, para tornar mais concreto para a criança o que será feito durante a consulta, também pode fazer muita diferença.
Em resumo, tentar oferecer o máximo possível de informações verdadeiras para a criança, em uma linguagem que ela consiga compreender, ao mesmo tempo em que mostramos que ela não estará sozinha, e que estaremos por perto sempre que ela precisar de apoio.
Como lidar com medos e fobias na infância?
Além do acolhimento, Eva Tartarotti fala também sobre a exposição gradual para ajudar as crianças a trabalharem seus medos, sejam grandes ou pequenos. Vamos ver mais um exemplo: uma criança que tem medo de cachorro pode começar a ver desenhos animados e livros que tenham o animal, depois ver outras crianças e adultos na rua acompanhados por cães, pessoas em praças e parques brincando com cachorros…
Depois, o contato com os filhotinhos, que mesmo sendo muito ativos não são ameaçadores, pode ajudar. Enfim, o contato físico com os animais, fazendo carinho, pegando no colo e, talvez, brincando juntos é um passo importante. “É fundamental respeitar o tempo da criança, que não é o mesmo que o nosso”, reforça a especialista.
Eva explica também que é preciso observar a frequência com que a criança é exposta àquilo que provoca o medo. Se não for algo tão recorrente, será que não podemos conduzir com mais calma?
“Vamos supor que seja uma criança que tem pavor de palhaço. Vale pensar: todo lugar que nós vamos tem palhaço? Será que isso é algo que ela precisa enfrentar agora, com urgência, pois está trazendo muitos prejuízos para a sua vida?”, questiona.
Existe o que é negociável e o que não é. Caso o medo esteja, de fato, impedindo a criança de viver novas experiências, brincar, estudar, ir à escola, criar laços e tudo o mais, aí sim, não podemos negociar, pois são situações que ela vai enfrentar a vida toda. A questão, então, é refletir sobre o que pode ou não ser negociado de acordo com a realidade de cada família.
Por FABIANA ZVEITER
Fonte: https://quindim.com.br/blog/medos-e-fobias-na-infancia/